Por Rosa Riscala e Mariana Ciscato*

[02/07/24]

… O dia começa com discursos de dirigentes do BCE no Fórum sobre Bancos Centrais de 2024, em Portugal, com destaque para as falas de Christine Lagarde e Jerome Powell (10h30). Campos Neto também está lá e participa. Entre os indicadores nos EUA, é importante o relatório Jolts, com a abertura de vagas em maio (11h), que antecede o payroll na 6ªF. Aqui, a agenda é fraca, mas o leilão de títulos públicos do Tesouro pede atenção, após o movimento de stop loss na curva de juros com a escalada do dólar, que fechou a R$ 5,65. O exterior não ajudou, mas o estresse reflete uma crise de confiança no governo Lula, associada ao ceticismo com o cumprimento do arcabouço fiscal e receios de ingerência nas decisões do BC a partir de janeiro/25, com o sucessor de RCN.

… Não passa um dia sem o presidente criticar os juros elevados, Campos Neto e a autonomia do Banco Central, sinalizando que as coisas serão diferentes com o nome que ele indicar, apesar dos esforços de Galípolo para assumir um discurso técnico. 

… Nesta 2ªF, em entrevista a uma rádio da Bahia, Lula voltou a atacar a gestão da política monetária. “Quem quer o Banco Central autônomo é o mercado. Nós não precisamos ter juro alto neste momento. A taxa Selic a 10,50% está exagerada.”

… Ele não se conforma com o fato de não poder demitir RCN: “Como pode um presidente da República ganhar as eleições e não poder indicar o presidente do Banco Central? Eu estou há dois anos com o presidente do Banco Central do Bolsonaro.”

… Ao mesmo tempo, os receios com as contas públicas são crescentes e amplificados pela resistência de Lula às propostas da Fazenda para reduzir os gastos. Só o que ele aceita é um pente-fino nos benefícios assistenciais para coibir fraudes.

… Criticando o “pessimismo” do mercado com o arcabouço, Padilha confirmou que esse é o plano, ao dizer que o próximo Relatório de Receitas e Despesas, a ser enviado ao Congresso no dia 22, mostrará o compromisso com a responsabilidade fiscal.

… Parafraseando Lula, o ministro disse que “quem fica especulando sobre irresponsabilidade fiscal vai errar de novo”.

… À noite, em novo confronto, o presidente disse que “não tem que prestar conta a nenhum ricaço desse País, a nenhum banqueiro, mas sim ao povo pobre”. Lula sustenta essa guerra há duas semanas, sem parecer preocupado com a forte depreciação do real.

… No intervalo de um mês, o dólar acumula alta de 7,67%. Em 2024, de 16,48%.

… Parte dos profissionais de câmbio acredita que o BC deveria intervir para frear a escalada do dólar, mas nem todos pensam assim, porque não há disfuncionalidade no mercado. A disparada se dá por desconfianças com o fiscal.

… Em comentário ao BDM, Alfredo Menezes (Armor Capital) disse que o BC não deveria quebrar o parâmetro da disfuncionalidade, mas está convencido de que essa situação é inflacionária e levará o mercado a pedir aumento dos juros.

… No Boletim Focus, houve nova deterioração nas medianas de IPCA e do câmbio; a expectativa de inflação de 2024 subiu para 4% enquanto a de 2025, para 3,87%. Ou seja, distanciando-se a cada semana da meta de 3%.

… Para a taxa de câmbio, a estimativa passou de R$ 5,15 para R$ 5,20 no final de 2024 e de R$ 5,15 para R$ 5,19 no fim de 2025.

… Para a Selic, (ainda) não houve mudanças. As medianas para 2024, 2025 e 2026 seguem em 10,5%, 9,5% e 9,0%.

… Ainda na Focus, o déficit nominal projetado para 2025 subiu, passando de 6,48% do PIB para 6,50%, ante 6,30% um mês atrás.

… Já nesta 2ªF, a curva do DI passou a precificar um aumento de 100pbs da taxa Selic ainda neste ano, enquanto o dólar batia máxima sobre máxima. A alta dos juros dos Treasuries contribuiu, porém como fator coadjuvante.

… O real teve o pior desempenho entre os emergentes, e perdeu feio dos seus pares, os pesos mexicano e chileno (abaixo).

HADDAD – À saída da Fazenda, e ao final de um dia difícil, o ministro falou para os jornalistas que o câmbio “tende a se acomodar” quando os processos de decisão sobre os gastos do governo forem concluídos.

… Haddad atribuiu a alta do dólar a “muitos ruídos”, dizendo que “precisamos comunicar melhor os resultados econômicos que o País está atingindo, como a arrecadação de junho acima do esperado pela Receita, por exemplo”.

… Segundo ele, apesar dos reveses com a desoneração da folha e os impactos das cheias no Rio Grande do Sul, está otimista com a economia e as contas da União.

… Haddad disse que está marcada para amanhã (4ªF) a próxima reunião com Lula para discutir o cenário econômico e confirmou que assuntos como o dólar e o corte de gastos estão na pauta.

… O ministro reiterou que a equipe econômica segue elaborando um diagnóstico do quadro fiscal para o presidente, mas que ainda não há data para um anúncio de quais medidas serão tomadas, “porque essa decisão cabe à Presidência da República”.

… Lula, disse ele, tem o compromisso de não ferir direitos, especialmente das camadas mais pobres da população. “O presidente não vai tomar uma decisão sem saber a quem isso vai afetar. As pessoas que precisam ser protegidas, serão protegidas.”

… Sobre o novo Relatório de Despesas e Receitas, o ministro disse que tem um arcabouço a ser cumprido. “O bloqueio ou o contingenciamento vai ser do tamanho necessário para que as nossas metas sejam atingidas.”

MAIS AGENDA – Logo cedo (5h), o IPC-Fipe fechado de junho deve acelerar para 0,39%, contra 0,09% em maio.

… Em Brasília, Pacheco recebe governadores para discutir projeto de renegociação das dívidas dos Estados, às 12h30.

… Pela proposta elaborada pelo presidente do Senado, uma parte dos recursos pagos pelos Estados mais endividados deverá capitalizar um novo fundo que será usado para bancar investimentos da União nos Estados.

… O projeto pode beneficiar inclusive os governadores que não participam da atual renegociação. O objetivo é conter a insatisfação de governadores sem dívida e que reclamavam de tratamento favorecido aos mais endividados.

ZONA DO EURO – A leitura preliminar de junho do índice de inflação ao consumidor (CPI) sai às 6h.

CÍRCULO VICIOSO – No cabo de guerra para ver quem é mais forte, Lula fala e o mercado responde com um salto por dia do dólar, chamando também o BC para a briga, que ainda não quis entrar nesta disputa irracional no câmbio.

… Head da Tesouraria do Travelex Bank, Marcos Weigt, concorda com Alfredo Menezes que não é hora de intervir, porque o mercado está funcional e motivado por risco. “O BC artificialmente defender uma taxa não funciona.”

… Ao Broadcast, ele disse que confiar que, mais cedo ou mais tarde, o mercado naturalmente se equilibrará.

… Enquanto essa autorregulação não vem, o real segue vivendo seu inferno astral. Ontem, ficou na lanterninha não apenas das moedas latinas, como de todas as principais moedas globais, para ver o tamanho da confusão armada.

… Com a corrida por proteção, diante de quadro fiscal doméstico e da possível vitória de Trump nos EUA, o dólar à vista fechou em alta firme de 1,16%, negociado a R$ 5,6533, muito perto da máxima do dia (R$ 5,6578).

… Seguindo à risca a nova ofensiva de alta do dólar, os juros futuros começaram o mês sob pico de estresse, na inércia de mau humor. Quanto mais caro fica o dólar, mais a curva do DI exibe ousadia nas apostas para a Selic.

… O canal inflacionário está cada vez mais contaminado. Bradesco Asset elevou a projeção do IPCA de 2024 para 3,8%, de 3,7%, citando principalmente a alta dos preços industrializados, devido à depreciação recente do real.

… No fechamento, o DI Jan/25 subiu a 10,835% (de 10,733% no pregão anterior); Jan/26 disparou mais de 20pb, a 11,770% (de 11,550%); Jan/27, a 12,060% (de 11,930%); Jan/29, 12,38% (de 12,310%); e Jan/31, 12,490% (12,460%).

… Reportagem do Broadcast aponta que o diferencial entre os juros longos do Brasil e dos EUA vem abrindo (“boca de jacaré”), diante da piora da percepção de risco doméstica, sobretudo com a situação fiscal e os ruídos políticos.

… Enquanto em junho o rendimento da T-Note de 10 anos registrou trajetória descendente, fechando o mês na casa dos 4,30% (com a chance de Fed dovish), as taxas longas no Brasil, ao contrário, subiram, para além dos 12%.

À PROVA DE BALAS – O Ibovespa resistiu ontem ao fogo cruzado entre Lula e a Faria Lima, porque teve a sorte de poder contar com a força do minério de ferro (+2,50%) e do petróleo, que puxaram as blue chips das commodities.

… No fechamento, o índice à vista exibia alta de 0,65%, a 124.718,07 pontos, com giro de R$ 20,6 bi. A XP enxerga uma melhora nos fundamentos das empresas e mantém a projeção de 145 mil pontos para o Ibov no fim do ano.

… Ontem, Vale ON subiu 1,48%, a R$ 63,14, e comenta-se que poderia ter subido mais, não fosse o desconforto com a renúncia de integrantes do conselho, um ruído negativo ao processo de sucessão que está ocorrendo na empresa.

… Quatro meses depois de José Luciano Penido renunciar ao colegiado da mineradora, denunciando uma “evidente e nefasta influência política” na empresa, outra conselheira independente decidiu seguir o mesmo caminho.

… Vera Marie Inkster, que votou no final do ano passado pela permanência do CEO, Eduardo Bartolomeo, entregou seu cargo ontem, agravando a crise no conselho, devido ao aumento da influência do governo por meio da Previ.

… “A saída do segundo conselheiro em menos de quatro meses indica a existência de pensamentos muito diferentes na companhia e mostra que o dissenso segue prevalecendo em assuntos de interesse de seu conselho”, disse a Ativa.

… Para o Citi, a segunda baixa em poucos meses levanta importantes preocupações de governança corporativa.

… Na cola do petróleo (Brent para setembro, +1,88%, para US$ 86,60), que operou animado pela atividade industrial na China acima do esperado, Petrobras ON registrou +1,21% (R$ 40,87) e Petrobras PN, +1,52% (R$ 38,63).

… A dobradinha positiva de Vale e Petro ofuscou o impacto negativo dos bancos: Itaú (-0,46%; R$ 32,24), Bradesco ON (-0,71%; R$ 11,11), Bradesco PN (-0,89%; R$ 12,27), Santander (-0,36% R$ 27,36) e BB (-1,31%; R$ 26,36).

… Equatorial (+4,37%) e Sabesp (+4,24%) se destacaram entre os maiores ganhos, repercutindo a confirmação de que a companhia elétrica foi a única a entregar proposta para a aquisição de 15% da empresa de saneamento.

… Já os papéis mais sensíveis aos juros futuros ficaram na lista negativa: Assaí (-3,29%) e Pão de Açúcar (-2,96%).

TORRA-TORRA – Bateu um receio ontem no investidor americano de que uma possível vitória de Trump na eleição de novembro para a Casa Branca abra o caminho para o aumento dos gastos públicos e do déficit dos EUA.

… O ex-presidente foi contemplado nesta 2ªF pela decisão da Suprema Corte de que ele tem direito a receber imunidade parcial nos processos a que responde na Justiça, aumentando as chances de voltar a Washington.

… Trump ainda ganhou capital político nos últimos dias, diante do fracasso de Biden no debate. A Bloomberg informou, porém, que os democratas avaliam nomear Biden formalmente no próximo dia 21 como candidato.  

… Antecipando uma gastança se os republicanos vencerem a corrida presidencial, o juro dos Treasuries de dez anos chegou a flertar com 4,5% e, no fechamento dos negócios, avançava para 4,478%, contra 4,370% no pregão de 6ªF.

… Parte do impulso das taxas foi contido por duas leituras da atividade industrial, que consolidaram a percepção de que o Fed pode cortar o juro em setembro. O PMI medido pelo ISM caiu a 48,5 em junho, contra previsão de 49,1.

… O mesmo indicador medido pela S&P Global também veio mais fraco (51,6) do que a estimativa, de 51,8.

… O avanço dos yields dos Treasuries limitou parte do ímpeto das bolsas em NY, com Dow Jones (+0,13%, a 39.169,52 pontos) e S&P 500 (+0,27%; 5.475,09 pontos) em leve alta. O Nasdaq subiu mais forte: 0,83% (17.879,30).

… Tesla disparou 6,05%, com especulações de que Musk estaria avançando na implementação do Robotaxi.

… No câmbio, o mercado recebeu com algum alívio o resultado do primeiro turno das eleições legislativas na França, que apontou a extrema-direita com uma liderança um pouco menor do que as pesquisas eleitorais sugeriam.

… A esperança é de que os grupos radicais não consigam formar uma maioria absoluta na Assembleia Nacional, que pode se fragmentar em três blocos rivais. O euro subiu 0,25%, a US$ 1,0741, e libra fechou estável, a US$ 1,2648.

… Em fórum do BCE, Lagarde reconheceu o progresso na inflação, mas disse que o trabalho ainda não terminou.

… O iene (-0,41%, a US$ 161,50) perdeu força com a forte revisão em baixa do PIB/1Tri do Japão, que sofreu queda anualizada de 2,9%, contra estimativa inicial de uma contração significativamente menor, de 1,8%.

EM TEMPO… ÂMBAR, empresa de energia do grupo J&F, concluiu aquisição da termelétrica a gás natural Araucária (Uega) por R$ 395 mi. Ativo pertencia à Copel e à Petrobras, com participações de 81,2% e 18,8%, respectivamente.

ELETROBRAS concluiu venda de 49% em 15 sociedades de propósito específico (SPEs) que formam complexo eólico Chapada do Piauí para Infraestrutura Brasil Holding XX, gerido pelo Pátria, e para o Invenergy Wind South America.

SABESP. A presidente do conselho de administração, Karla Bertocco, ocupava, até dezembro, um cargo no colegiado da Equatorial, única interessada em virar acionista de referência da companhia de saneamento de SP…

… Segundo a gestão Tarcísio, Bertocco pediu desligamento da Equatorial meses antes de o diálogo com grupos interessados na privatização começar, mas a dupla atuação abre discussão sobre possível conflito de interesses.

MULTIPLAN aprovou a 14ª emissão de debêntures, no valor de R$ 500 milhões.

DIRECIONAL aprovou a distribuição de dividendos no valor de R$ 277,2 milhões, o equivalente a R$ 1,60 por ação, com pagamento em 16/7; ex em 5/7.

BTG PACTUAL informou que o acionista GIC atingiu 5,030% do total de ações PN.

AMERICANAS. Comitê independente nomeado pelo conselho de administração da varejista para apurar as fraudes na empresa encerrou seus trabalhos (Lauro Jardim/O Globo)…

… O advogado Otavio Yasbek, que comandou o comitê nos últimos 18 meses, já informou que entregará seu relatório ao conselho provavelmente na semana que vem.

AOS ASSINANTES DO BDM, BOM DIA E BONS NEGÓCIOS!

*com a colaboração da equipe do BDM Online

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