Economia

Estadão: Jogo do Trigrinho é alvo de mais de 500 investigações policiais em São Paulo

Atualizado 01/07/2024 às 08:00:41

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Reproduzimos aqui reportagem especial do Estadão sobre o jogo que está deixando muita gente endividada

A 3.ª Delegacia do Departamento de Investigações Criminais (Deic), da Polícia Civil de São Paulo, investiga a atuação de organizações criminosas que estariam aplicando golpes por meio de jogos de cassino online, que prometem o ganho de dinheiro fácil e rápido. O mais famoso da modalidade é Fortune Tiger, popularmente conhecido como Jogo do Tigrinho, contra o qual já existem mais de 500 boletins de ocorrência registrados, segundo a polícia.

Conforme o Deic, as plataformas ficam hospedadas fora do País e são clandestinas. Nos golpes são usados perfis falsos e grupos nas redes sociais para atrair vítimas; ou, então, golpistas pagam influenciadores digitais. Para convencer usuários, esses blogueiros fazem postagens simulando uma vida de luxo, supostamente conquistada com o dinheiro adquirido no jogo.

“O que apuramos nos inquéritos é que esses influenciadores têm feito postagens falsas de supostos ganhos no jogo. Ou seja, aquela quantia de R$ 10 mil, R$ 20 mil, R$ 90 mil que eles falam que ganham não é realidade. São postagens falsas que enganam os usuários e fazem com que passem a apostar cada vez mais”, diz o delegado Eduardo Miraldi.

Segundo a polícia, tem gente que até chega a ganhar prêmios em alguns casos. Mas, ao fazer o pagamento de um valor exigido para liberar a quantia total, a conta é bloqueada e o prêmio não chega ao apostador. “Esses eventuais prêmios não são reais, temos inúmeros boletins de ocorrência registrados no Estado de pessoas que apostaram e ganharam, mas nunca receberam o prêmio. O golpe está aí”, afirma Miraldi.

E quem são esses influenciadores?

Influenciadores digitais mirins de cinco Estados, entre eles crianças de 6 e 7 anos, estão sendo pagos para fazer propaganda de cassinos de apostas virtuais. O caso foi denunciado ao Ministério Público de São Paulo (MP-SP) no dia 17 pelo Instituto Alana, organização voltada aos direitos das crianças. O instituto identificou cerca de 50 conteúdos de apostas protagonizados por nove influenciadores menores de idade no Instagram. Juntos, eles têm mais de 36 milhões de seguidores. Uma garotinha de 6 anos e um menino de 7 estão entre os impulsionadores de conteúdo com apostas online.

O Ministério Público informou que a Promotoria de Infância e Juventude da capital instaurou uma Peça de Informação na qual foram requeridas informações preliminares ao Instagram sobre os fatos. A Meta, dona do Instagram, disse que restringe menores de 13 anos em suas plataformas e não permite conteúdos de apostas em dinheiro para menores de 18 anos.

As divulgações foram identificadas em nove perfis do Instagram, gerenciados por influenciadores mirins com idades entre 6 e 17 anos, nos quais jogos de apostas similares a máquinas de caça-níqueis eram promovidos a esse público-alvo. De acordo com Maria Mello, coordenadora do eixo Digital do instituto, por utilizarem a influência de celebridades mirins, os conteúdos são classificados como publicidade infantil proibida no Brasil.

Crimes

Além dos influenciadores e dos donos das plataformas, a polícia também diz investigar as intermediárias dos pagamentos feitos pelos usuários, e já chegou a indiciar parte dos golpistas. Veículos e imóveis de suspeitos também foram apreendidos, segundo o governo de São Paulo.

Além da contravenção penal por jogo de azar, os envolvidos podem responder por estelionato, crime contra a economia popular, associação criminosa e lavagem de dinheiro. O Fortune Tiger emula um caça-níquel, no qual uma roleta é acionada pelo usuário, que “ganha o dinheiro” ao obter uma sequência de figuras repetidas. Como o ganho depende de sorte da vítima, a prática é considerada jogo de azar.

Vício e dívidas

Além disso, como consequência, a prática pode levar o jogador a desenvolver vício e acumular dívidas. Para piorar, o jogo passa a ser visto pela vítima como alternativa para recuperar o dinheiro perdido – mas continua sugando recursos do endividado.

O caso da enfermeira Gabriely Sabino, de 23 anos, moradora do interior paulista que fugiu de casa, chamou a atenção para o Jogo do Tigrinho. Segundo a família, amigos disseram que a jovem, que já foi reencontrada, estava viciada nesse jogo de apostas online e acumula dívidas. Em entrevista ao SBT, Gabriely disse que estava viciada no jogo e havia contraído uma dívida de R$ 20 mil. Além disso, teria pedido dinheiro a um agiota; e que foi para o Centro-Oeste do País por estar com medo.

Nem quem ganha leva

Também se multiplicam as tentativas de golpes para se aproveitar dos apostadores. O Estadão procurou a empresa responsável pelo game online, mas não obteve resposta.

Uma família de Sorocaba (SP) joga o ‘Tigrinho’ desde o início do ano. Os quatro – a mãe, dois filhos e duas noras dela – seguem influenciadores que postam os jogos com aposta mínima de R$ 10. Há uma semana o filho e a nora da dona de casa tiveram os jogos bloqueados após depositar R$ 300 para resgatar um suposto ganho de R$ 4.060.

“Ele ganhou R$ 2.460 e ela R$ 1.600, mas não conseguiram sacar. Ele tinha depositado R$ 100 e ela, R$ 200, mas foram bloqueados. Era golpe”, disse a mulher que pediu anonimato “por vergonha”.

O filho disse que, ao atingir o valor mais alto, foi informado por um suposto auditor que sua conta tinha sido bloqueada por segurança e colocada sob “controle de risco”. O pedido inicial foi de um depósito de R$ 200 para liberar o saque. Depois, foi convencido a pôr mais dinheiro, para evitar bloqueio permanente, a menos que depositasse R$ 700. “Fique tranquilo, nossa plataforma vem de um país respeitável”, escreveu o golpista.

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