Morning Call
Impacto do pacote não bate com contas do mercado
Por Rosa Riscala e Mariana Ciscato*
[29/11/24]
… Os mercados em NY operam em horários reduzidos nesta Black Friday, com as bolsas fechando às 15h e os Treasuries, às 16h. A agenda internacional prevê o resultado do PIB de alguns países da Europa e a inflação na zona do euro. Aqui, é difícil arriscar uma projeção para o dia, após a violenta reação dos investidores ao pacote de contenção dos gastos públicos. O que era para ser um choque positivo das expectativas, acabou adicionando mais incertezas e piorando a percepção de risco fiscal. A entrevista de Haddad e de técnicos da Fazenda não conseguiu acalmar a turbulência dos negócios. Economistas contestam a economia de R$ 70 bilhões anunciada e apresentam cálculos de um impacto bem menor e insuficiente. Além disso, há dúvidas sobre as chances de as medidas passarem no Congresso.
… A despeito do compromisso de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco, que prometeram todo o esforço para votar as propostas ainda neste ano, todo mundo sabe que as matérias do Executivo chegam de um jeito no Legislativo e saem de outro.
… O primeiro suspense é sobre a compensação da reforma da renda, que isentou faixa do IR até R$ 5 mil.
… Os parlamentares até podem aprovar essa medida que é popular, e implica uma renúncia estimada em R$ 35 bilhões pelo governo, mas quem garante que vão aumentar a tributação dos mais ricos? E se não aprovarem?
… O governo se precipitou em anunciar a reforma em cima de uma variável pela qual não pode responder e agravou a situação fiscal.
… Algumas medidas foram consideradas na direção certa, como a mudança no reajuste do salário mínimo, que limitou o aumento real em 2,5%, e do abono salarial, que passará a ser pago para quem recebe até um salário e meio, e não mais dois salários.
… Já a decisão de manter os pisos da Saúde e da Educação, que deve continuar ameaçando o arcabouço fiscal, foi uma frustração a quem esperava mudanças estruturais. Nem nos números do governo o mercado acreditou.
… Para a Warren Investimentos, a economia do pacote deve ser de 62% do valor anunciado de R$ 71,9 bilhões, ou cerca de R$ 45 bilhões.
… Já economistas do Itaú Unibanco calculam um potencial de economia de R$ 53 bilhões nos próximos dois anos, 2025 e 2026, enquanto nas contas da Monte Bravo, as medidas resultarão numa contenção de despesas em torno de R$ 40 bilhões a R$ 45 bilhões.
… Para Felipe Miranda (Empiricus), o pacote do governo Lula cria uma ponte até 2026, quando será essencial promover uma rediscussão profunda estruturante e reformista. “A partir de 27, independentemente de qual governo for eleito, será inevitável revisitar a questão fiscal.”
.… Depois de esperar um mês, o mercado projeta agora mais inflação e mais juros.
… O ceticismo e o mau humor com o pacote fiscal levou o dólar a bater R$ 6 pela primeira vez desde o Plano Real, enquanto a curva do DI passava a projetar uma Selic terminal de 14,75%, com a aposta de 100pbs em dezembro ganhando força (abaixo).
GALÍPOLO – Cobrado a adotar uma mensagem hawkish, diante da explosão de pessimismo vivida ontem pelos mercados, o futuro presidente do BC não decepcionou em palestra à noite, durante evento do Esfera Brasil, em SP.
… Reconheceu que o BC está incomodado com a desancoragem da inflação corrente e das expectativas, repetiu que meta [de inflação] se cumpre e que cabe ao Copom colocar a Selic em nível restritivo pelo tempo necessário.
… Em dia de estouro do dólar para R$ 6, disse que o real depreciado e a economia aquecida levam a imaginar convívio com juro elevado e que, pior do que o impacto da inflação para a população, seria o BC não subir o juro.
… Em um discurso sem concessões políticas, avisou que elevar a taxa em um mandato de quatro anos é normal. “Se pretende ser Miss Simpatia, lugar não é BC”, observou Galípolo, que assume o comando do BC em janeiro.
… Ele ainda aproveitou para reiterar várias vezes a independência do BC para tocar a política monetária como quiser.
… A ênfase na postura autônoma veio horas depois do desconforto provocado pelos comentários do ministro Rui Costa, que está em “contagem regressiva” para ter um BC dirigido “por quem mora no Brasil e não em Miami”.
… Numa direta para Campos Neto, o ministro da Casa Civil atribuiu o nervosismo no mercado ontem à ação “deliberada” de RCN, que “boicota o governo, cria sensação permanente de instabilidade e só fala mal do Brasil”.
… Segundo Rui Costa, Lula já escolheu os nomes dos novos diretores do BC, que devem ser encaminhados hoje ou, no máximo, na próxima semana. Os mandatos de Otavio Damaso e Carolina Barros terminam no último dia do ano.
… Em discurso fechado no Palácio do Planalto nesta 5ªF, o presidente Lula qualificou o pacote fiscal de “coisa extraordinária” para a contenção do excesso de despesas e para garantir o cumprimento do arcabouço fiscal.
MAIS AGENDA – Galípolo, Guillen, Haddad e Tebet participam de almoço da Febraban (11h30).
… Entre os indicadores, o IBGE deve mostrar que o mercado de trabalho brasileiro segue apertado com a divulgação da Pnad Contínua, às 9h.
… Mediana das expectativas em pesquisa Broadcast aponta que a taxa de desemprego deve ter caído para 6,2% no trimestre até outubro, de 6,4% até setembro. As projeções vão de 6,0% a 6,4%.
… Às 8h30, o BC informa o primário do setor público consolidado, que deve mostrar superávit de R$ 40,5 bilhões, após déficit de R$ 7,34 bilhões em setembro. A coletiva do BC sobre os números será às 14h30.
… O Tesouro divulga o relatório mensal da dívida pública de outubro às 15h30, com coletiva às 16h.
… Sem horário definido, a Aneel divulga a bandeira tarifária de dezembro.
LÁ FORA – A zona do euro divulga o CPI preliminar de novembro, às 7h. A expectativa é que o índice cheio acelere de 2% para 2,4% na comparação anual. O núcleo deve subir de 2,7% para 2,9%.
… Vários países divulgam PIB do 3Tri, como França (4h45), Turquia (4h) e Canadá (10h30). No final da noite, saem na China os dados oficiais do PMI da indústria e dos serviços em novembro.
FOGO NA FARIA LIMA – Dólar a R$ 6 e projeção de Selic em quase 15% dão a medida do dia de cão nos mercados, em que o pacote fiscal caiu como uma bomba, na reação potencializada pela medida populista do IR.
… Não bastasse a desconfiança de que o corte de gastos será desidratado e a taxação dos super-ricos enfrentará muitas resistências, também a isenção tributária pretendida antecipa a perda de potência da economia fiscal.
… O desfecho previsível deste quadro negativo, na avaliação do mercado, é que o BC será cobrado a dar uma resposta mais agressiva na política monetária. Estão dizendo que +0,75pp para a Selic em dezembro virou piso.
… Bancos estrangeiros já começam a puxar a régua ontem, antecipando maior pressão fiscal adiante. O JPMorgan passou a apostar em um choque de 1pp no juro mês que vem e revisou a aposta da Selic terminal para 14,25%.
… O Barclays, que ainda confiava que o Copom manteria o ritmo de aperto em meio ponto, passou agora a esperar aceleração da dosagem a 0,75pp, com o ciclo de alta fechando em 13,50% (de 12,75% antes) e com riscos para cima.
… Na curva do DI, sempre na vanguarda do estresse fiscal, alguns contratos já testaram 14% ontem, o que não se via desde o governo Dilma, segundo anotou a jornalista Denise Abarca, no Broadcast. Deu o termômetro do caos.
… No espaço de 24h, as apostas isoladas de alta de 1pp na Selic em dezembro arrancaram de 4% para 28%. Também já é quase majoritária a precificação desta mesma dose de 1pp em janeiro e março, com Selic terminal de 14,75%.
… A perspectiva de um ciclo de aperto mais agressivo e mais longo disparou pressão generalizada no câmbio e DI.
… O contrato de juro para janeiro de 2026 cravou a máxima histórica de fechamento, a 13,91%, contra 13,55% na véspera. Jan/27 foi a 14,040% (de 13,620%) e Jan/29, a 13,910% (pico do dia, contra 13,450% no pregão anterior).
… Na ponta longa, o vencimento para Jan/31 fechou a 13,750% (de 13,290%); e Jan/33, a 13,630% (13,160%).
… Em meio ao estresse, o Tesouro foi malsucedido no leilão de títulos públicos, colocando apenas um lote pequeno de LTN, a metade da oferta, e nada de NTN-F – o papel preferido dos gringos.
… Com o governo riscando o fósforo nos negócios, o dólar atingiu a inédita marca de R$ 6 no pior momento (R$ 6,0036). A moeda americana terminou o dia em alta de 1,29%, a R$ 5,9895, novo recorde histórico nominal.
… Para hoje, espera-se mais volatilidade no mercado de câmbio, parte dela atribuída à disputa da taxa Ptax.
… A forte injeção de dinheiro esperada na economia com a isenção tributária para quem ganha até R$ 5 mil traz riscos potenciais à inflação e também pode turbinar o crescimento do PIB, exigindo trabalho dobrado do Copom.
… Às vésperas do PIB/3Tri, que o IBGE solta na próxima 3ªF, o Itaú aponta viés de alta em sua estimativa de 3,2% para o acumulado do ano, caso o Brasil confirme expansão de 0,6% entre julho e setembro, após +1,4% no 2Tri.
STRIKE – Com a confiança do investidor abalada desde a noite anterior, depois do pronunciamento de Haddad, já nos primeiros minutos do pregão, o Ibovespa perdeu os 127 mil pontos.
… Depois da abertura, o índice à vista continuou rolando ladeira abaixo. Furou os 126 mil pontos, para em seguida romper os 125 mil e fechar aos 124.610,41 pontos, num mergulho de 2,40% no dia.
… Foi o menor nível de fechamento em cinco meses (desde 28/6) e a maior baixa porcentual desde 2 de maio (também de 2,4%). Faltando só hoje para fechar novembro, o Ibov acumula queda de 3,93%. No ano, afunda 7,14%.
… O giro de R$ 27,7 bilhões no dia, novamente acima da média recente – mesmo sem a referência de NY -, denunciou o forte movimento de fuga do risco.
… Com o risk-off rodando alto, as blue chips afundaram. Petrobras ON recuou 1,67% (R$ 41,75) e PN (-1,03%; R$ 38,59). Vale perdeu 1,03% (ON, a R$ 57,53), a despeito do minério de ferro estável em Dalian.
… Bancos e papéis sensíveis aos juros foram os grandes perdedores do dia. Bradesco PN caiu 4,20% (R$ 12,76), Bradesco ON, -3,69% (R$ 11,23), Itaú, -3,60% (R$ 32,68), Santander, -3,04% (R$ 24,90); e BB, -2,93% (R$ 24,48).
… MRV liderou as perdas, com -14,10% (R$ 5,30), seguida por CVC (-13,38%; R$ 2,33) e Renner (-10,16%; R$ 14,50).
… Na outra ponta, exportadoras se beneficiaram do dólar caro. No topo da lista positiva, JBS avançou 3,35%, a R$ 36,38. Suzano subiu 3,00%, a R$ 61,53; SLC Agrícola, +2,64%, a R$ 17,52; e Klabin, +1,97% (R$ 21,71).
PETRÓLEO – A cotação do Brent/jan subiu 0,66%, a US$ 72,78 o barril, na ICE, depois de a Opep+ adiar de 1º para 5 de dezembro a reunião que vai decidir se os cortes de produção serão mantidos no início de 2025.
… Apuração da Reuters informou que o cartel está discutindo o adiamento do aumento da produção para o 1Tri25.
… Entre as questões que precisam ser abordadas, está o aumento da produção dos Emirados Árabes Unidos, atualmente programada para começar em janeiro, segundo duas fontes da Opep+ ouvidas pela agência.
… O banco ANZ espera que o cartel e seus aliados adiem o aumento para fevereiro, permitindo que o grupo analise o impacto da nova administração dos EUA sobre comércio e política externa.
THANKSGIVING DAY – Sem negócios em NY e liquidez limitada pelo feriado nos EUA, o índice DXY fechou estável (-0,03%), em 106,048 pontos.
… Depois de forte altas nos últimos dias, em meio à expectativa de elevação de juros pelo BoJ, o iene recuou 0,31%, a 151,546/US$.
… O euro (-0,09%, a US$ 1,0557) e a libra (+0,09%, em US$ 1,2689) fecharam estáveis. Na Alemanha, a leitura preliminar do CPI de novembro acelerou de 2% para 2,2%, na comparação anual, mas abaixo da expectativa de 2,3%.
… Em entrevista, Christine Lagarde chamou atenção para o impacto inflacionário de uma eventual guerra comercial entre EUA e Europa.
… Se os governos europeus retaliarem, desencadeando um conflito comercial transatlântico, haveria um impacto na demanda e na produção econômica global, disse a presidente do BCE.
EM TEMPO… VALE pagará R$ 2,22 bilhões em JCP, no valor bruto de R$ 0,52 por ação. A data de corte é 11 de dezembro; ‘ex’ a partir do dia 12. A data de pagamento está prevista para março de 2025.
ITAÚ aprovou a distribuição de JCP no valor líquido de R$ 0,2639 por ação, com pagamento em 30/4/25; ex em 10/12/24.
ASSAÍ. Sharp Capital Gestora de Recursos atingiu o montante de 69.479.153 ações ON de emissão da companhia, correspondentes a 5,14% dos papéis do tipo.
MRV&CO. A empresa de loteamentos do grupo, Urba Desenvolvimento Urbano, aprovou a 8ª emissão de debêntures, no valor de R$ 150 milhões.
ULTRAPAR aprovou programa de recompra de até 25 milhões de ações, o que representa cerca de 2,29% dos papéis em circulação.
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*com a colaboração da equipe do BDM Online
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